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Estudantes da USP são destaque no maior congresso de inteligência artificial do mundo

congresso

Por Beatriz Montesanti

Imagine um programa que responda automaticamente, e com quase 90% de precisão, todos os e-mails recebidos pelo atendimento ao cliente de empresas. Agora imagine que tal ferramenta de alta tecnologia e complexidade tenha sido desenvolvida por dois jovens estudantes de graduação como seu trabalho de conclusão de curso, e que eles tenham sido dois dos poucos estudantes de graduação aceitos no maior congresso de inteligência artificial do mundo.

Por improvável que pareça, esta é a história de Rogério Bonatti, bolsista da Fundação Estudar, e seu colega Arthur Gola. Em 2015, os dois apresentaram o melhor trabalho final do curso de mecatrônica da Poli-USP, no misterioso e atraente campo da inteligência artificial.

Os dois desenvolveram sozinhos um TCC que foi considerado pelos professores o melhor do ano na Escola Politécnica da USP. Contentes com a conquista, mas não satisfeitos, decidiram inscrever o projeto para a maior conferência de inteligência artificial do mundo, a Association for the Advancement of Artificial Intelligence (AAAI), que neste ano ocorreu em Phoenix, capital do Arizona, nos Estados Unidos.

O projeto foi aprovado e lá, eles não apenas eram os únicos representantes de uma universidade brasileira, como também um dos poucos estudantes de graduação a participar de todo o evento, que reuniu cerca de 1.200 pessoas, na maior parte PhD’s ou professores.

“Ao mesmo tempo que fiquei feliz por poder representar o Brasil nesta importante conferência, me impressionou o fato de termos apresentado o único projeto vindo de uma universidade brasileira. Apesar de haver tantos alunos e professores aqui, o número de publicações internacionais ainda é muito baixo comparado com o nosso potencial”, lamenta Rogério. “Mesmo sem receber apoio financeiro de nenhuma instituição, conseguimos fazer um trabalho de impacto e apresentá-lo na conferência”

Sem conseguir apoio da USP para irem ao congresso, eles lançaram uma campanha de crowdfunding que levantou R$ 18 mil, valor necessário para viabilizar a viagem. “Conhecemos muitas pessoas e aprendemos muito fazendo apresentações para doadores”, diz Rogerio, apontando outra vantagem da iniciativa.

Como retorno, estão dando palestras sobre inteligência artificial aos doadores, mas também aos alunos da Poli: “Também quisemos dar algo em retorno para alunos da Poli, informar sobre esse tema e inspirá-los, mostrando para eles o que serão capazes de fazer em cinco anos”, diz.

“Muitos estudantes universitários são acostumados a ouvir que cinco é dez. Não é. Não devemos nos contentar com pouco. Cinco é a metade do que podemos alcançar, e devemos sempre ter como objetivo high standards”, critica Rogério. “As pessoas acabam sendo levadas pelo exemplo negativo”.

 

O Desenvolvimento

Arthur explica que o trabalho começou como um projeto que atuasse com autoatendimento na área médica. “Existem muitos dados para a tecnologia nesse campo e a ideia era fazer um totem de triagem para o atendimento”, diz. O sigilo às informações do paciente, porém, acabou por inviabilizar o plano.

Influenciado por seu mentor na Fundação Estudar, Rogério sugeriu que eles se voltassem para o ramo educacional. “Começamos a discutir os principais problemas que podiam ser resolvidos nessa área. O primeiro era o relacionamento com clientes, milhares de alunos de Educação à Distância [EAD] e o recebimento constante de e-mails com o mesmo tema. É muito caro ter um staff de relacionamento com cliente grande assim para responder a toda essa demanda”, explica.

A primeira ideia foi utilizar uma tecnologia já existente: o Watson, inteligência artificial desenvolvida pela IBM que venceu um ser humano no jogo altamente intuitivo Jeopardy. Entraram em contato com cientistas da IBM, mas os cronograma não se encaixaria – o programa ainda não possuía tradução para o português. Decidiram então, mesmo sem saber por onde começar, que desenvolveriam uma tecnologia própria.

Para realizar os primeiros testes, Rogério enviou uma mensagem à rede da Fundação Estudar perguntando se conheciam alguma empresa disposta a compartilhar seus dados. Tiveram mais de 20 retornos positivos: “Nossos celulares não paravam de vibrar. Recebemos ligações desde fundos de private equity até de startups”, lembra o bolsista. Optaram, ao final, por realizar o trabalho com o banco de dados da própria Fundação Estudar.

Para ajudar a desenvolver pedaços dos códigos necessários ao sistema, os estudantes convocaram calouros engajados. “Foi uma experiência de liderança diferente, escolhendo que tarefas designar para que eles se mantivessem motivados.”

O trabalho feito a seguir foi um misto de teoria e prática, com muitos testes empíricos e muitos ciclos em que os resultados deram errado. No início, a precisão do sistema, que chegou ao final a 87%, era de apenas 30%. O processo exigiu muito tempo e consulta a professores, alguns dos quais pouco motivadores.

“No início do projeto chegamos a ouvir que não teríamos sucesso, e que deveríamos mudar nosso tema para algo mais fácil”, diz Rogério. “Mas ao final tivemos nota dez. Um dos professores disse que nunca tinha dado nota dez para um TCC antes”.

O projeto teve uma recepção tão positiva que os dois jovens receberam propostas de estágios de várias das empresas onde apresentaram a ideia. Ao concluir a graduação, porém, os dois já têm em mente novos desafios: Rogério foi aceito para um PhD nos Estados Unidos; Arthur está atuando em uma consultoria de big data.

A inteligência artificial que criaram, porém, continua no horizonte para os dois: “O nosso trabalho nos mostrou uma série de coisas, entre elas a intersecção importante que existe entre ciência e produto. Por isso, ainda não sabemos se o timing é certo, mas temos certeza que o produto que criamos vale uma startup”, avalia Arthur.

 

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