Por Suéli Bonafim
Início de 2014, Departamento de Química da UFSC, Florianópolis. Eu subia as escadas em direção ao laboratório onde fazia mestrado em química inorgânica quando fui tomada por um choque de realidade: “O que ainda estou fazendo aqui? O mundo é tão grande, sou jovem, posso ter inúmeras experiências e, ainda assim, aqui estou eu fazendo o mesmo caminho, subindo as mesmas escadas do mesmo departamento onde fiz a graduação e agora faço mestrado”, pensei comigo mesma.
Não me entendam mal – o departamento de química da UFSC é um dos mais conceituados do país. Tive excelentes professores e, sem dúvida, o departamento oferece todas as condições para formar ótimos químicos. No entanto, eu não queria ser mais um dos alunos que faz iniciação científica na mesma universidade, mestrado na mesma universidade, doutorado na mesma universidade, e, não raro, pós-doc na mesma universidade. Definitivamente a zona de conforto já não era mais confortável para mim.
Meu nível de francês era zero e meu inglês não era lá dos melhores, o que me deixava extremamente insegura
Decidi que não queria mais ver o mundo apenas através do Globo Repórter, e logo comecei a pesquisar por universidades bem-conceituadas em diversos países a fim de me candidatar para o doutorado. Filtrei as minhas buscas por universidades apenas com base no que eu queria para meu doutorado e futuro acadêmico; eu não tinha um país em mente e a língua não foi algo que me preocupou de início, pois eu ainda teria um ano para aprimorar o inglês e, no geral, é possível conduzir um doutorado inteiro apenas com o inglês na maioria das grandes universidades no exterior.
A preparação – e um pedido de bolsa negado!
Foi então que em Montreal, no Canadá, encontrei uma universidade com um programa de pós-graduação que se alinhava aos meus objetivos: a Universidade de Montreal (UdeM). Esta universidade está situada na província de Québec, onde se fala francês – mas ao invés de ver a língua como uma barreira, tomei esse fato como mais uma oportunidade para alargar ainda mais minha experiências. Na época meu nível de francês era zero e meu inglês não era lá dos melhores, o que me deixava extremamente insegura. Então, para conseguir o aceite do meu orientador e da universidade, contei com a ajuda de Estudantes Embaixadores da UdeM que contatei através da página no Facebook Université de Montréal-Brasil.
O comitê que avaliou meu pedido de bolsa enviou os motivos pelos quais a bolsa foi indeferida e, com base nisso, eu tive um mês para redigir minha defesa
Todo o processo de admissão foi relativamente simples e feito completamente online. Uma vez de posse de toda a documentação necessária, fiz o pedido de bolsa de estudos para doutorado pleno através do programa Ciência Sem Fronteiras. O primeiro susto do processo foi a notícia de que o meu pedido de bolsa foi negado. Se isso aconteceu, ou caso venha a acontecer com você que está lendo este artigo, não entre em pânico ainda! Existe uma saída: entrar com um pedido de recurso. O comitê que avaliou meu pedido de bolsa enviou os motivos pelos quais a bolsa foi indeferida e, com base nisso, eu tive um mês para redigir minha defesa que consistiu em nada mais que contrapor de forma objetiva os argumentos dados pelo comitê. Definitivamente valeu a pena não ter desistido no primeiro susto, pois foi assim que finalmente, em fevereiro de 2015, eu tive a resposta positiva ao meu pedido de bolsa para doutorado pleno no Canadá!
Vida em Montréal
Comecei o doutorado em maio de 2015 e de lá pra cá Montreal vem se mostrando um lindo presente que tive o privilégio de ganhar. A cidade recebe a cada ano em torno de 18000 estudantes estrangeiros oriundos de inúmeros países, o que faz desta cidade uma pérola exótica de cultura e diversidade na América do Norte! Os reflexos por ser uma cidade cosmopolita são vistos na forma das pessoas se vestirem, na gastronomia, nos festivais e demais eventos que Montreal oferece abundantemente, mas o que continua me encantando até hoje é sair pra rua e ouvir pessoas conversando nas mais diversas línguas! É interessante destacar que, por ser uma cidade bilíngue, é possível se virar muito bem no dia-a-dia apenas com o inglês, mas é claro que é fundamental fazer aulas de francês o quanto antes, afinal, estamos no Quebec!
É importante frisar que, apesar de a Universidade de Montreal ser oficialmente francófona, nós estudantes temos o direito de escolher a língua que preferirmos (entre francês ou inglês) para escrever nossa dissertação ou tese, fazer provas e dar seminários.
Iniciei há pouco tempo meu segundo ano no doutorado em química inorgânica, e meu projeto tem como foco o desenvolvimento de complexos metálicos para catalisar a formação de polímeros biodegradáveis. Aqui tenho toda a infraestrutura necessária para conduzir minha pesquisa, nunca me faltou um único reagente e qualquer equipamento que se quebre é rapidamente consertado. Meu orientador é incrível, tanto como pessoa quanto como pesquisador, e posso dizer com segurança que é uma inspiração para mim!
Para finalizar, só me resta dizer que eu recomendo fortemente a experiência de estudar fora, conhecer novos países, novas culturas, novas línguas, sair da zona de conforto. Sei que não é fácil, mas será menos difícil se começarmos a olhar para o novo como oportunidade, e não como barreira. O mundo é nosso quintal.
Sobre Suéli Bonafim
Catarinense de 26 anos, Suéli é formada em química pela UFSC. Depois de terminar o mestrado na ilha de Florianópolis, resolveu se mudar para outra ilha: Montréal. Hoje, faz doutorado em química inorgânica na Université de Montréal e escreve esta coluna no Estudar Fora com o intuito de ajudar e incentivar outras pessoas que, assim como ela, querem alçar voo em busca de novas experiências
* Foto: Suéli em Montréal / Crédito: UdeM
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