Por Claudia Gasparini, da Exame.com
Aos 25 anos de idade, a paulistana Ana Beatriz Pousada se deparou com uma escolha que poucos jovens da sua idade têm o privilégio de fazer: entre quatro excelentes universidades norte-americanas, eleger aquela em que faria seu doutorado. O motivo da dúvida? Ela foi aprovada em todas.
Graduada em economia pela USP (Universidade de São Paulo) e com mestrado pela PUC (Pontifícia Universidade Católica), Ana Beatriz foi aceita pelas universidades de Columbia, Chicago, Yale e Stanford. Na dúvida entre as duas últimas, acabou ficando com Stanford — sobretudo pelo fato de que o programa de PhD inclui mais cedo a etapa da pesquisa, sua grande paixão.
“Gosto da profundidade da pesquisa, de poder pensar num tema a fundo, investigar os porquês de um fenômeno”, explicou a jovem em entrevista exclusiva a EXAME.com. “Além disso, muitas vezes você descobre coisas que podem sustentar novas políticas que ajudem o Brasil a crescer”.
Ana Beatriz é pesquisadora na área de economia do trabalho, tema que começou a estudar durante o mestrado. Foi no meio da faculdade, aos poucos, que ela descobriu seu interesse pela carreira acadêmica — que pretende seguir após os 6 anos de doutorado que a esperam na cidade de Palo Alto, na Califórnia.
Confira a seguir os principais trechos da nossa conversa com a jovem economista, que explica os motivos de seu sucesso precoce e dá dicas para outros jovens que se interessam em seguir o mesmo caminho:
EXAME.com – Como foi a sua trajetória entre o vestibular e a aprovação no doutorado, aos 25 anos, em uma das instituições mais respeitadas do planeta?
Ana Beatriz Pousada – Estudei no colégio Vera Cruz e passei na Fuvest, no curso de economia, aos 18 anos. Em 2013 me formei pela FEA-USP [Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo]. Ao longo da graduação fui percebendo que tinha muito interesse por pesquisa e que queria fazer mestrado.
Comecei então a trabalhar como assistente de um professor da FEA ao mesmo tempo em que estudava para o exame da Anpec [Associação Nacional dos Centros de Pós-graduação em Economia], que é exigido para fazer mestrado em economia. Por ter estudado tanto, acabei indo muito bem nessa prova e entrei na PUC-Rio [Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro], que tem um dos melhores mestrados do Brasil na minha área.
No segundo ano do mestrado, decidi me candidatar ao doutorado em várias instituições norte-americanas e britânicas. Fui aceita em quatro universidades dos Estados Unidos: Yale, Stanford, Columbia e Chicago. Estava em dúvida entre Yale e Stanford, porque ambas têm excelentes programas e muitos professores com uma linha de pesquisa parecida com a minha. Acabei escolhendo Stanford, principalmente pelo formato do curso de PhD, em que você já começa a atividade de pesquisa no segundo ano.
Você terá alguma bolsa de estudos em Stanford?
Sim, vou contar com uma bolsa dada pelo próprio departamento, que cobre a mensalidade do doutorado. Também há um valor extra que eles pagam todo mês, que é aproximadamente o custo de vida no bairro da universidade. O objetivo é que o aluno não tenha muita preocupação financeira, isto é, que tenha uma vida confortável, sem luxos, durante os 6 anos de curso.
O que foi mais difícil nos processos seletivos?
A parte mais desafiadora foi escrever uma carta dizendo por que eu seria uma excelente aluna de doutorado para essas instituições. Tenho a impressão de que, na nossa cultura brasileira, nós não temos o costume de falar muito sobre as nossas qualidades, sobre aquilo que fazemos bem.
Precisei fazer várias versões do texto. Pedi para colegas e familiares lerem os meus rascunhos. Eles apontaram o que que eu poderia melhorar e pontos em que estava sendo muito humilde. Finalmente, consegui chegar a uma versão do texto que me satisfez.
O programa de pós-graduação em economia da Universidade de Stanford recebe mais de 700 candidaturas por ano e as turmas iniciais são formadas por apenas 25 alunos. O que ajudou você a derrotar toda essa concorrência?
Acho que, para fazer doutorado, você tem que ter interesse muito grande em pesquisa, e isso existe em mim. Eu quero seguir carreira acadêmica, como pesquisadora, e esse desejo transparece na minha trajetória. Acho que transpareceu também na minha candidatura, daí a minha aprovação.
Além disso, com certeza me ajudou muito ter tido notas altas em todas as disciplinas tanto na graduação quando no mestrado. Você manda a sua vida acadêmica inteira para eles analisarem, todo o seu histórico. Minha experiência como assistente de pesquisa na USP e na PUC e a qualidade do meu trabalho de dissertação também contribuíram.
Outro ponto decisivo foram as cartas de recomendação que fizeram para mim. Dizem que um dos fatores mais importantes para a aprovação no doutorado é ter uma boa relação com os professores durante o mestrado. Eu tive esse bom relacionamento, e isso me ajudou muito — tanto para conseguir boas cartas de recomendação quanto para fazer uma pesquisa bem feita.
Como foi o seu desempenho nas provas de admissão?
Fiz duas. Uma é o TOEFL [Test Of English as a Foreign Language], que mede a proficiência em inglês. Minha pontuação foi 113, de um total de 120. Também fiz o GRE [Graduate Record Examinations], uma prova de matemática e inglês. As escolas orientam que a gente gabarite ou quase gabarite a parte de matemática. Cai a matéria do ensino médio brasileiro, não é a matemática que aparece no ensino superior. Há muitas questões de raciocínio lógico, para avaliar como a gente lida com problemas matemáticos. Nessa prova eu tirei a nota máxima, que é o que eles pedem geralmente.
O que mais aconteceu no processo seletivo?
Além de tudo que descrevi, também precisei apresentar um currículo, que apresentou minha experiência profissional. Nesse documento informei que ganhei uma bolsa chamada “FAPERJ Nota 10”, que é dada para as duas maiores notas do mestrado pela FAPERJ [Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro].
O que atrai você na carreira acadêmica?
São várias razões. É uma carreira que dá muitas oportunidades de viajar, conhecer outros países, outras culturas, outras universidades e dialogar com pessoas muito diferentes. Além disso, tem pesquisa, que é algo que eu adoro, principalmente ao poder escolher o tema.
Gosto da profundidade da pesquisa, poder pensar num tema a fundo, investigar os porquês de um fenômeno. Além disso, muitas vezes você descobre coisas que podem sustentar novas políticas que ajudem o Brasil a crescer.
O que você pensa do momento atual da academia no Brasil? Por que preferiu fazer seu doutorado no exterior?
O Brasil tem universidades muito boas e pessoas fazendo pesquisa de alta qualidade. O problema é que a academia brasileira ainda é muito pequena, está em processo de crescimento. Isso faz com que haja menos especialistas em determinados temas. A academia está muito mais madura e desenvolvida nos Estados Unidos, pelo menos em economia. Por isso, a maioria maciça dos acadêmicos da minha área faz doutorado lá.
Só para dar uma ideia, na PUC havia 15 professores no meu departamento, enquanto em Stanford há mais de 70 pessoas. Todos os professores da PUC são ótimos, mas o departamento é menor, mais enxuto. Existe um ganho em contar com uma amplitude maior de especialistas em vários assuntos, daí a minha decisão de ir para fora.
Qual é o seu conselho para jovens que querem seguir um caminho parecido com o seu?
Acho que os espaços estão abertos. O mais importante é mesmo estudar e ir atrás. Se você tem interesse legítimo em pesquisa, isso vai aparecer na sua trajetória e deve se refletir na sua candidatura. Acaba dando certo. Muitos brasileiros vão fazer doutorado em grandes universidades americanas, já faz muitos anos, principalmente na área de economia. Sem dúvida é um sonho possível.
Esta matéria foi originalmente publicada por Exame.com