As carreiras constroem-se com o tempo. Oportunidades inesperadas e obstáculos aparecem – no trabalho e na vida pessoal – e afetam a forma como uma pessoa progride nesse caminho, especialmente no caso das mulheres. O mesmo emprego que levará alguém à diretoria de uma empresa pode conduzir outra pessoa a uma posição estagnada. Há muitos caminhos e nenhuma garantia. Tudo faz parte da jornada.
Entretanto, já se sabe que certas decisões, especialmente em começo de carreira, podem aumentar as chances de obter sucesso a longo prazo. Então, a questão principal para termos mais mulheres na direção das empresas parece ser a seguinte: como é possível maximizar a probabilidade de que as jovens mais promissoras obtenham sucesso, logo no começo de carreira?
Por meio de entrevistas e pesquisas com centenas de executivas bem sucedidas, nós identificamos os anos depois da graduação como período crítico para uma trajetória bem sucedida. “Acertar” na primeira década de atividade pode garantir promoções mais rápidas e opções de emprego melhores, na faixa dos 30 anos de idade. E isso levaria a oportunidades ainda maiores e recompensas financeiras em seus 40, 50 anos ou mais.
Por outro lado, “errar” logo de cara causa efeitos desproporcionais ao longo da vida, especialmente se essas decisões não são corrigidas durante a década seguinte.
Ou seja, para as mulheres, o preço de um começo de carreira ruim é ainda maior do que para seus colegas homens. Afinal, a faixa dos 30 anos costuma ser mais desafiadora, graças às responsabilidades familiares recentes. Isso significa, portanto, que há menos tempo e energia disponíveis para consertar o problema.
Mas o que significa, exatamente, “se sair bem”?
Os quatro eixos de um bom começo de carreira
Ainda que cada pessoa ocupando cargos de chefia tenha sua própria trajetória, há uma série de capacidades e traços que as executivas bem sucedidas ganham ao longo de sua jornada. Em resumo, são quatro habilidades essenciais que ajudam a formar uma líder logo no começo de carreira.
#1 Gestão de pessoas
Executivas de sucesso sabem como gerir pessoas. Os pontos cruciais da gestão de pessoas incluem aprender como gerir sua própria performance, manejar a forma como se reporta a chefes, administrar sua performance como membro de um time e, por fim, comandar uma equipe pequena. A década seguinte à graduação é ideal para conseguir tais experiências.
Saber como estabelecer e entregar resultados, com expectativas realistas, é crucial. Isso significa se responsabilizar por fazer o combinado nos prazos estabelecidos, bem como avisar às pessoas que dependem disso caso não consiga finalizar tudo no dia determinado. Significa, também, responsabilizar-se pelos seus relatórios e saber quando interferir, para garantir que sua equipe atinja as metas.
#2 O básico dos negócios
Outro ponto em comum entre as mulheres em cargos de liderança está no quão cedo aprenderam funções básicas de administração e como esses processos se conectam. O começo de carreira é o período de ganhar domínio de uma área, como finanças, contabilidade ou marketing, ao mesmo tempo em que se aprende o “básico” das outras. É o tempo de aprender como essas funções se conectam em uma organização e como isso acontece na prática. Por exemplo, a elaboração de relatórios de cada setor e as reuniões.
#3 Curiosidade organizacional e estratégica
Estar no topo exige um entendimento de como as organizações mudam ao longo do tempo e, ainda, como a cultura organizacional pode ajudar ou atrapalhar esse processo. Nesse sentido, uma jovem profissional pode aproveitar os anos no começo de carreira para desenvolver sua curiosidade sobre aspectos culturais e decisórios das empresas. Por exemplo, não só quem toma as decisões, mas de que forma isso é feito.
Também é uma boa hora para acompanhar mídias que falem sobre o contexto dos negócios, e seus aspectos econômicos, sociais e políticos. Afinal, isso vai impactar as decisões da empresa e sua performance.
#4 Habilidades de networking e de construir relações
Executivas de sucesso mantêm e expandem suas redes ao longo de sua trajetória profissional. O começo de carreira é o período para iniciar esse processo, conhecendo de perto grupos de pessoas em diversas equipes e funções. Também é um bom momento para conhecer gente de outras empresas e organizações. Trabalhando, comendo e socializando juntos, jovens profissionais podem formar um grupo de pessoas em um estágio semelhante da carreira e buscar ajuda conforme progridem.
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Os aceleradores do começo de carreira
Ainda que muitos caminhos possam levar a um cargo de liderança, há uma série de empregos para jovens profissionais que costumam ser bastante competitivos – e que podem ajudar quem deseja adquirir as habilidades acima. Nós chamamos isso de “aceleradores de começo de carreira”.
Apesar das vantagens óbvias que esses empregos podem proporcionar, as pesquisas dão conta de que mulheres geralmente evitam se candidatar a eles. A percepção geral é de que tais postos exigem longas horas de dedicação, em um ambiente de trabalho difícil. E, ainda: olhando de fora, eles não parecem motivadores para as mulheres como opções de longo prazo. As business schools costumam ser encaradas de forma semelhante, graças também ao nível de investimento financeiro necessário.
Consultorias estratégicas
A diversidade e a dimensão dos projetos que uma profissional encontra em uma consultoria estratégica torna esse ambiente um bom ponto de partida para qualquer carreira. De fato, mesmo passando apenas dois anos em uma empresa do tipo, logo no começo de carreira, pode fazer uma grande diferença. Basta olhar a lista de ex-funcionários dessas empresas e que hoje comandam organizações em todas as indústrias, setores e países.
Setor financeiro
Assumir um cargo que ajude a solidificar um entendimento básico de finanças, como e por que certos projetos recebem investimentos, é um tempo bem gasto. Sentir-se confortável falando com bancos e lidando com imposto de renda, orçamentos, fluxo de caixa e planilhas de balanço é algo valioso para qualquer líder.
Além disso, as oportunidades para trabalhar com diversos clientes por uma variedade de indústrias, aumenta perspectivas e capacidades de estabelecer relações. Ou seja, o setor financeiro serve como trampolim para aumentar o networking.
Empresas “blue chip”
Trabalhar em empresas já estabelecidas e sólidas (as chamadas “blue chips”) pode não expor jovens profissionais a uma variedade tão grande de clientes, como é o caso das consultorias. Entretanto, tais companhias costumam oferecer os melhores programas de trainee. Iniciativas nesses moldes são conhecidas por oferecer chances para desenvolver expertise em uma função, aumentar noções sobre estratégia e, claro, estabelecer relações profissionais. E mais: ser contratado por empresas assim adiciona mais credibilidade ao currículo.
Pequenas empresas
Uma rota menos conhecida – mas que costuma aparecer de forma positiva em nossas entrevistas – é trabalhar em empresas menores com possibilidade de crescimento rápido. Aqui, estamos falando de companhias que já se estabeleceram melhor do que uma simples startup. Como esses empreendimentos crescem bastante e precisam montar uma estrutura básica desde o começo, jovens profissionais – na casa dos 20 e poucos anos – costumam ganhar experiência prática na gestão de pessoas e no básico de administração. Ainda que não haja, por exemplo, um programa de trainee, as pesquisas sugerem um impacto positivo de aprender tais habilidades cedo, mesmo que numa escala menor.
Business schools
Outro “acelerador” que nossas pesquisas identificaram – o que não foi uma surpresa, já que o ponto de partida foram ex-alunas da Kellogg School – foi estudar numa boa business school. Os benefícios citados incluem desde aprender o beabá de administração, ter acesso a líderes e CEOs, conhecer uma variedade de organizações, construir relações e mesmo obter experiência comandando times. Tudo isso, ainda, em um período curto de tempo.
Se quisermos mais mulheres em cargos de comando, precisamos que elas se saiam bem no começo de carreira. As boas notícias: há muitas formas de acumular o conhecimento necessário, já nos primeiros anos de trabalho. As notícias mais complicadas, por outro lado, vêm do fato de tais mulheres precisarem, inicialmente, participar de ambientes que não conhecem, compreendem ou apreciem de imediato.
Mas, como nossas entrevistas deixam evidente, investir tempo e esforço para usar tais aceleradores vai render dividendos com o passar dos anos, independentemente dos planos de longo prazo. Um bom começo de carreira se traduz em melhores ferramentas para usar no futuro, em qualquer que seja o setor de atuação.
Este artigo foi publicado, originalmente, na publicação Kellogg Insight.