Em idos de 2014, o engenheiro Mário Coelho enfrentava um dilema: continuava num emprego que gostava, em que construía usinas hidrelétricas, ou deixava-o para estudar mudanças climáticas (o que implicaria investir em uma pós-graduação no exterior)?
Na Conferência Na Prática, evento de carreira da Fundação Estudar que tem diversas temáticas ao longo do ano, ele encontrou a resposta: em uma conversa com um coach da organização, decidiu arriscar e ir atrás do sonho.
O sonho? Um mestrado executivo em Sistemas Sustentáveis de Energia do Programa MIT Portugal, uma parceria internacional entre o governo português e o famoso Massachussetts Institute of Technology (MIT) e que trata de áreas como energia renovável e bioengenharia.
Hoje doutorando pelo mesmo programa, ele está no EUA estudando com um objetivo claro: quer trazer ao Brasil seu know how para ajudar o país a investir em energia renovável.
Em um relato ao NaPrática.org, ele apresenta sua motivação para estudar mudanças climáticas, sua experiência no MIT e bons argumentos para ser protagonista na conquista de seus objetivos.
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De Minas Gerais para o MIT
Em julho deste ano, eu estava trabalhando no MIT, mais especificamente na Sloan School of Management, e li uma manchete: “ANA reduz vazão mínima dos reservatórios de Sobradinho e Xingó para 550 m³/s”.¹
De longe, vendo os veleiros do MIT no rio Charles, que fica entre as cidades americanas de Boston e Cambridge, imaginei a tristeza de se ver o famoso rio São Francisco, onde ficam esses reservatórios, sofrer uma seca sem precedentes.
Há mais de quatro anos, essa importante bacia brasileira tem vazões mensais inferiores às médias históricas – o que significa, na prática, que o rio hoje está muito seco.
Esse cenário tem afetado diariamente a vida de muitas famílias que dependem da água, seja para irrigação, transporte e pesca, quanto para o lazer.
Trata-se de um dos impactos do aquecimento global – e daqui de longe, como poderia eu ajudar a melhorar a saúde do rio São Francisco?
[O rio São Francisco em tempos de cheia e hoje em dia]
A visão alemã
É um assunto importante para mim.
Nasci em Pirapora, à beira do rio e ainda criança me mudei para Belo Horizonte.
Ao longo da minha formação, meus valores contribuíram para minhas decisões de futuro.
Pensei em me tornar engenheiro para ajudar a construir um país melhor e, em 2006, comecei a estudar Engenharia Elétrica na UFMG.
Na graduação, ao descobrir a possibilidade de fazer um intercâmbio no exterior, não medi esforços para ser selecionado.
Fui para a Alemanha e fiz um intensivo de alemão em Freiburg antes de me mudar para estudar Engenharia em Schmalkalden. A cultura alemã, a pujança econômica do país e sua revolução energética (ou energiewende, como eles chamam) fizeram brilhar meus olhos.
Torres eólicas e painéis fotovoltaicos estavam espalhados por todo país, ajudando a alimentar as indústrias e a enorme malha ferroviária alemã.
Retornei ao Brasil decidido a trabalhar de verdade com energia renovável.
De volta à UFMG, me especializei em Fontes Alternativas de Energia.
Em 2009, um ano antes de me formar, entrei como estagiário na Hy Brazil Energia, onde trabalhei por cinco anos.
Na empresa, colaborei na construção de 13 pequenas usinas hidrelétricas que geram energia renovável e com baixo impacto ambiental no Sudeste brasileiro, a maioria em Minas Gerais – perto de Guanhães, cidade natal de meus pais.
Assim, a energia é gerada a preço competitivo perto da região de maior consumo, ajudando na redução de perdas no sistema elétrico e diminuindo a necessidade de longas linhas de transmissão.
Eu amava a sensação de chegar em uma linha de transmissão no interior mineiro, onde não havia nada e, meses depois, conectar uma usina e gerar energia no Sistema Interligado Nacional.
Os protestos de 2013 e a decisão de estudar mudanças climáticas
Em 2013, porém, durante os grandes protestos contra o governo e o sistema político brasileiro, algo me intrigou.
Eu estava realmente fazendo tudo que podia pelo país e pelo mundo? Trabalhar 80h por semana, gerar energia renovável e contribuir para PIB era suficiente?
Foi nessa época que conheci a Fundação Estudar.
Alguns amigos haviam participado do Núcleo Na Prática, uma rede da Fundação Estudar que reúne ex-participantes de seus cursos.
Como fruto das sementes implantadas pela Estudar, fundamos a ONG Amigos da Vetusta, que visa disseminar a cultura de retribuição para a UFMG, promove bolsas de estudo e reúne alumni para estudantes da Faculdade de Direito da universidade.
Ainda envolvendo a Estudar, participei da Conferência Na Prática em 2014, um evento de carreira que me inspirou e apresentou novas oportunidades profissionais.
Naquela época, eu pensava em continuar os estudos e havia encontrado uma pós-graduação que me interessava bastante.
Era um mestrado executivo em Sistemas Sustentáveis de Energia do Programa MIT Portugal, uma pós-graduação criada por uma parceria entre o governo português e o MIT e que trata de áreas como energia renovável e bioengenharia.
A dúvida, no entanto, era se eu largava ou não meu emprego na Hy Brazil.
Em uma conversa com o Thaylan Toth, um dos mentores da Fundação Estudar que conheci durante a Conferência Na Prática, fui incentivado a arriscar e correr atrás dos meus sonhos.
Foi quando os fluxos dos rios, marés e os objetivos de trabalhar com energia e ter impacto me levaram em direção ao rio Charles.
[Mário Coelho toma café em frente ao rio Charles / Foto: Acervo pessoal]
Um encontro no MIT
Deixei o emprego e entrei no mestrado em Sistemas Sustentáveis de Energia em 2014, quando gastei – na verdade investi! – o dinheiro da época de trabalho.
Após concluir o mestrado executivo em um ano, consegui uma bolsa de estudos para continuar no doutorado pelo mesmo programa em 2015.
Comecei a trabalhar em uma tese onde proponho uma nova forma de se fazer o planejamento da expansão do sistema elétrico brasileiro.
Ao longo desse tempo na pós-graduação, tentei aproveitar todas oportunidades que me foram dadas. Participei de programas de treinamento, conferências e workshops em mudanças climáticas, sustentabilidade, inovação e empreendedorismo.
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Aproveitar essas oportunidades fez toda a diferença, agregou conhecimento, abriu muitas portas, aumentou o dinamismo e impacto do meu doutorado.
Durante um workshop no MIT, bati na porta de um professor que me recebeu com um aperto de mão, apresentou-se como “John”, sentou-se na cadeira, colocou os pés em cima da mesa e perguntou o que eu queria.
John, no caso, era John Sterman, uma das maiores referências do MIT em System Dynamics (ou “Dinâmica de Sistemas”) e mudanças climáticas.
Ele e sua equipe do Climate Interactive estiveram presentes durante as negociações do Acordo de Paris sobre o clima, firmado em 2015, e trabalharam junto a representantes e negociadores para influenciar nações e propor metas mais agressivas para a contenção do aquecimento global.
Chocado com a simplicidade e objetividade com que fui tratado, disse humildemente que gostaria de aprender mais sobre System Dynamics (a teoria que uso em minha tese) e que queria ajudar a implantar mais energia renovável em meu país, que tem um enorme potencial para isso.
[Mário Coelho (à direita) e colegas no MIT / Foto: Acervo pessoal]
Aprendizados
Cheguei no departamento de System Dynamics no MIT há três meses e já aprendi muita coisa!
Acabei entrando em um treinamento com a equipe de John, que desenvolveu uma simulação de mudanças climáticas que consegue avaliar cenários para o aquecimento global no longo prazo.
Com essa e outras ferramentas, é possível conscientizar a população e tomadores de decisão sobre os esforços necessários para conter o aquecimento global abaixo dos 2ºC.
As simulações realizadas evidenciam que não basta o desenvolvimento e pleno emprego das energias renováveis – tão pouco a ação de um país separado – para resolver o problema.
É necessário criar um movimento global de limpeza da matriz energética.
Outra necessidade, tão ou mais importante que essa é a revisão de nossos padrões de consumo, principalmente em países desenvolvidos.
Também é preciso levar em conta que a população mundial está crescendo, enriquecendo e anseia por consumir bens e serviços que o planeta terá grandes dificuldades de fornecer para todos no futuro.
No campo pessoal, aprendi que protagonismo vale a pena. Vá atrás daquilo que te interessa e bata na porta – você nunca sabe o pode acontecer.
Afinal, quem imaginaria que eu, um caipira de Pirapora (com muito orgulho) poderia estar numa das melhores faculdades do mundo?
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